terça-feira, 23 de julho de 2013

Educação em números: por onde começar?

Por Flávia Marçal P. de Araujo


Enfocar a questão da educação em nível internacional e no Brasil, exige quase sempre um enorme esforço de concisão, face à amplitude do tema. Assim, sempre que se pretende abordar o assunto, se fez necessário escolher e especificar alguns aportes técnicos que serão empregados, em especial no que se refere à utilização das fontes estatísticas. Neste post, pretendemos identificar algumas dessas bases comumente utilizadas.
No âmbito internacional, podemos destacar as seguintes fontes:

 1) Dados da UNESCO sobre Educação no Brasil

A contribuição da UNESCO – órgão das Nações Unidas para a Educação e a Cultura, criado em 16 de novembro de 1945 com o objetivo de “criar condições para um genuíno diálogo fundamentado no respeito pelos valores compartilhados entre as civilizações, culturas e pessoas”[1] - tem se dado por meio de várias ações, como a adoção de uma linha editorial na área da educação, incluindo a tradução de notas sobre políticas de vários países, a implementação de projetos e a promoção de seminários para estimular o debate e subsidiar a elaboração, o acompanhamento e a avaliação das políticas de Educação Infantil. Publicado todos os anos desde 2002, o Relatório de Monitoramento Global de Educação para Todos - EPT - consolida algumas das diretrizes importantes traçadas pela UNESCO, e é preparado por uma equipe de especialistas independentes. Como seguimento do Fórum Mundial de Educação de Dacar (Senegal) em 2000, o Relatório avalia o progresso com relação às metas de Educação para Todos, que devem ser atingidas até 2015. O relatório inclui um Índice de Desenvolvimento de Educação para Todos - IDE (Education for All Development Index-EDI), um composto de indicadores sobre educação primária universal, sexo, qualidade e alfabetização.
O IDE é calculado dividindo-se cada um dos quatro índices e somando os resultados dessas divisões, sendo então composto por 1/4 do índice de freqüência ao ensino primário + 1/4 do índice de alfabetização de adultos + 1/4 do índice de paridade de gêneros, específico para EPT + 1/4 da taxa de sobrevivência na quinta série.

2) Dados do PNUD sobre o IDH

O Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento - PNUD constitui-se numa rede global de desenvolvimento da Organização das Nações Unidas, presente em 166 países. Seu mandato central é o combate à pobreza. Trabalhando ao lado de governos, iniciativa privada e sociedade civil, o PNUD conecta países a conhecimentos, experiências e recursos, ajudando pessoas a construir uma vida digna e trabalhando conjuntamente nas soluções traçadas pelos países-membros para fortalecer capacidades locais e proporcionar acesso a seus recursos humanos, técnicos e financeiros, à cooperação externa e à sua ampla rede de parceiros. O conceito de Desenvolvimento Humano é a base do Relatório de Desenvolvimento Humano - RDH, publicado anualmente, e também do Índice de Desenvolvimento Humano - IDH. Ele parte do pressuposto de que para aferir o progresso de uma população não se deve considerar apenas o aspecto econômico, mas também outras características sociais, culturais e políticas que influenciam a qualidade da vida humana. Essa análise é apresentada desde 1990 nos RDHs, que propõem uma agenda sobre temas de relevância, vinculados ao desenvolvimento humano, e agrupam tabelas estatísticas e informações sobre o assunto. A cargo do PNUD, o relatório foi idealizado pelo economista paquistanês Mahbub ul Haq (1934-1998). Na atualidade, é publicado em dezenas de idiomas e em mais de cem países.
Já a finalidade da elaboração do Índice de Desenvolvimento Humano foi oferecer um contraponto a outro indicador muito empregado, o Produto Interno Bruto - PIB - per capita, que considera apenas a dimensão econômica do desenvolvimento. Concebido por Mahbub ul Haq com a influência do economista indiano Amartya Sen, ganhador do Prêmio Nobel de Economia de 1998, o IDH pretende ser uma medida geral, sintética, do desenvolvimento humano. Não abrange todos os aspectos de desenvolvimento e não é uma representação da "felicidade" das pessoas, nem indica "o melhor lugar no mundo para se viver". Além de computar o PIB per capita, depois de corrigi-lo pelo poder de compra da moeda de cada país, o IDH também considera dois outros componentes: a longevidade e a educação. Para aferir a longevidade, o indicador utiliza números de expectativa de vida ao nascer. O item educação é avaliado pelo índice de analfabetismo e pela taxa de matrícula em todos os níveis de ensino. A renda é mensurada pelo PIB per capita, em dólar PPC (paridade do poder de compra, que elimina as diferenças de custo de vida entre os países). Essas três dimensões têm a mesma importância no índice, que varia de zero a um.

3) Dados da OECD

A Organização para a Cooperação Econômica e o Desenvolvimento (Organization for Economic Co-operation and Development) -OCDE - reúne os governos de países comprometidos[2] com a democracia e a economia de mercado ao redor do mundo para: 1) Apoiar o crescimento econômico sustentável; 2) Aumentar o emprego; 3) Aumentar o nível de vida; 4) Manter a estabilidade financeira; 5) Auxiliar outros países, no seu desenvolvimento econômico e contribuir para o crescimento do comércio mundial.
Como parte de sua atuação, a OECD publica anualmente um estudo intitulado “Education at a Glance”, com análise de dados quantitativos sobre a questão da educação em relação aos países que compõem a OECD e mais alguns países como Brasil, Chile, Israel e Federação Russa.
Outro ponto importante trazido pelo mencionado estudo diz respeito aos resultados do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes - PISA, dos Indicadores dos Sistemas de Ensino- INES, do Inquérito Internacional sobre Ensino e Aprendizagem -TALIS, e o Programa Internacional para a Avaliação das Competências em Adultos –PIAAC. Em conjunto, estes dados servem como parâmetro para avaliar a questão da qualidade da educação a partir da capacidade de adquirir competências. 

No âmbito nacional, destacamos as seguintes fontes:

4) Dados do INEP sobre os Censos Escolares[3]

Também conhecido como “Educacenso”, é uma radiografia detalhada do sistema educacional brasileiro realizada anualmente pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisa Educacionais Anísio Teixeira – INEP, Ministério da Educação - MEC e Serviço de Estatística da Educação e Cultura - SEEC, em parceria com as Secretarias de Educação nas unidades da Federação, tendo como alvo todas as escolas de Educação Básica no país. A ferramenta permite obter dados individualizados de cada estudante, professor, turma e escola do país, tanto das redes públicas (federal, estaduais e municipais) quanto da rede privada, incluindo taxas de aprovação, reprovação e concluintes. Todo o levantamento é feito pela Internet. A partir dos dados do Educacenso, é calculado o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica – IDEB, e é planejada a distribuição de recursos para alimentação, transporte escolar e livros didáticos, entre outros. É realizado anualmente, conforme determinação constante do §4º, do artigo 2º, da Lei 9424/96. 

5) Dados do SAEB, Prova Brasil, ENEM e IDEB

O Sistema de Avaliação da Educação Básica - SAEB, conforme estabelece a Portaria n.º 931, de 21 de março de 2005, é composto por dois processos: a Avaliação Nacional da Educação Básica - ANEB -  e a Avaliação Nacional do Rendimento Escolar - ANRESC.
A ANEB é realizada por amostragem das redes de ensino, em cada unidade da Federação e tem foco nas gestões dos sistemas educacionais. Por manter as mesmas características, a ANEB recebe o nome de SAEB em suas divulgações. A ANRESC é mais extensa e detalhada que a ANEB e tem foco em cada unidade escolar. Por seu caráter universal, recebe o nome de Prova Brasil em suas divulgações.
A Prova Brasil avalia alunos de 4ª e 8ª séries do Ensino Fundamental, da rede pública e urbana de ensino. Considerando este universo de referência, a avaliação é censitária, e assim oferece resultados de cada escola participante, das redes no âmbito dos municípios, dos estados, das regiões e do Brasil. O SAEB, por sua vez, é uma avaliação por amostra. Isso significa que nem todas as turmas e estudantes das séries avaliadas participam da prova. A amostra de turmas e escolas sorteadas para participarem do SAEB é representativa das redes estadual, municipal e particular no âmbito do País, das regiões e dos estados. Dessa forma, não há resultado do SAEB por escola e por município. Participam do SAEB alunos de 4ª e 8ª séries do Ensino Fundamental, e também os da 3ª série do Ensino Médio regular, tanto da rede pública quanto da rede privada, em área urbana e rural (neste último caso, apenas para a 4ª série, no nível das regiões geográficas). Os resultados do SAEB, em conjunto com as taxas de aprovação escolar, são a base de cálculo para o IDEB de cada estado e do Distrito Federal e, conseqüentemente, do Brasil.
Já o Exame Nacional do Ensino Médio – ENEM,  tem o objetivo de avaliar o desempenho do estudante ao fim da escolaridade básica. Podem participar do exame alunos que estão concluindo ou que já concluíram o Ensino Médio em anos anteriores. Atualmente é utilizado como critério de seleção para os estudantes que pretendem concorrer a uma bolsa no Programa Universidade para Todos (ProUni). Além disso, cerca de 500 universidades já usam o resultado do exame como critério de seleção para o ingresso no Ensino Superior, seja complementando ou substituindo o vestibular.
O Índice de Desenvolvimento da Educação Básica - IDEB foi criado pelo INEP em 2007 e representa a iniciativa pioneira de reunir num só indicador dois conceitos igualmente importantes para a qualidade da educação: fluxo escolar e médias de desempenho nas avaliações. Ele agrega ao enfoque pedagógico dos resultados das avaliações em larga escala do INEP a possibilidade de resultados sintéticos, facilmente assimiláveis, e que permitem traçar metas de qualidade educacional para os sistemas. O indicador é calculado a partir dos dados sobre aprovação escolar, obtidos no Censo Escolar, e médias de desempenho nas avaliações do INEP: o SAEB – para as unidades da federação e para o país, e a Prova Brasil – para os municípios. 

6) Dados do IBGE

Para fins da pesquisa aqui realizada, os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE que foram considerados são os referentes à Pesquisa Nacional por Amostragem de Domicílio – PNAD, que indica diversas características socioeconômicas da população brasileira, como trabalho, rendimento, educação, entre outros.
A coleta é realizada anualmente, e também leva em consideração a autodeclaração do entrevistado quanto a sua etnia.
Dentre os principais aspetos que serão considerados estão a taxa de atendimento[4], taxa de escolarização bruta[5], taxa de escolarização líquida[6] e a taxa de analfabetismo[7].
Esclarecemos que a cada dez anos é realizado o censo demográfico, e que no ano de realização deste, não é realizada a PNAD. Daí a ausência dos dados do PNAD no ano de 2000, em que foi realizado o último censo.

7) Dados da Plataforma Dhesca:

A Plataforma Dhesca é uma iniciativa da sociedade civil, mais especificamente do Movimento Nacional dos Direitos Humanos, inspirada na experiência das relatorias de direitos humanos da ONU. Reúne mais de 36 movimentos e organizações da sociedade civil em defesa dos direitos humanos, econômicos, sociais, culturais e ambientais Os relatores são voluntários, escolhidos para mandatos de dois anos, em um conselho de seleção que tem entidades da sociedade civil, mas também participam pessoas de agências multilaterais com sede no Brasil, como as agências da ONU, do próprio Ministério Público Federal, da comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados e do Senado.
A Plataforma Dhesca realiza missões de monitoramento. O projeto começou em 2001 e hoje está na quinta geração de relatores, a qual termina no final do ano. A partir de denúncias apresentadas pela sociedade civil, realizamos missões de monitoramento sobre eventuais violações: já foram realizadas mais de 100 missões a partir das ações das relatorias.
As Relatorias Nacionais em Direitos Humanos são uma iniciativa da Plataforma Dhesca Brasil e capítulo brasileiro da Plataforma Interamericana de Derechos Humanos, Democracia y Desarollo (PIDHDD). Sua missão é ser um instrumento de ampliação e exigibilidade dos Direitos Humanos no Brasil, tendo em vista sua realização integral (promoção, proteção e reparação) para todas e todos, por meio da análise e da articulação de situações de violações locais de direitos humanos - casos emblemáticos - com a situação geral desses direitos no país.






[1] Extraído do folheto “UNESCO: o que é? O que faz?”. p.2. Disponível em: www.unesco.org/pt/brasilia. Acesso em: 19 de janeiro de 2010.
[2] Compõem a OECD os seguintes países: Austrália, Áustria, Bélgica, Canadá, República Checa, Dinamarca, Finlândia, França, Alemanha, Grécia, Hungria, Islândia, Irlanda, Itália, Japão, Coréia, Luxemburgo, México, Holanda, Nova Zelândia, Noruega, Polônia, Portugal, República Eslovaca, Espanha, Suécia, Suíça, Turquia, Reino Unido e os Estados Unidos.

[3] “Até 1995, o órgão do Ministério da Educação (MEC) responsável pela produção de estatísticas estava desaparelhado e desprestigiado. Não havia regularidade na coleta das informações nem uniformidade nos procedimentos. Não existiam instrumentos eficazes para garantir a precisão dos dados declarados. As informações produzidas não retornavam às Secretarias Estaduais e Municipais de Educação e às escolas. Não havia controle social sobre os recursos empregados, e cada unidade do MEC trabalhava com sua própria base de dados, gerando duplicidade e desperdício de recursos. Os dados eram extremamente desatualizados e insuficientes para uma análise adequada das informações. Para se ter uma idéia, até janeiro de 1995, o último Censo da Educação Básica, concluído e divulgado era o de 1989, contendo apenas os dados do ensino regular”. In: DINIZ, Ednar Maria Vieira. O censo escolar. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos,Brasília: v. 80, n. 194, p. 156-163, jan./abr., 1999.
[4] É um indicador que permite avaliar o acesso da população em idade escolar ao sistema educacional, independente do nível/modalidade de ensino, podendo ser calculada para as faixas 0 a 6 anos, 7 a 14, 15 a 17 e 18 a 24 anos. Maiores informações em: www.ibge.gov.br.
[5] É um indicador que permite comparar o total de matrículas de determinado nível de ensino com a população na faixa etária adequada a esse nível de ensino. Idem.
[6] É um indicador que identifica o percentual da população em determinada faixa etária matriculada no nível de ensino adequada a sua faixa etária. Idem.
[7] Tanto no censo demográfico decenal, quanto no Pnad, são considerados analfabetas as pessoas incapazes de ler e escrever pelo menos um bilhete simples na língua que conhecem. Quando a pessoa já aprendeu a ler e escrever, mas esqueceu, bem como nos casos em que a pessoa não sabe escrever o próprio nome, também é considerada analfabeta. Assim, a taxa de analfabetismo é o percentual de pessoas analfabetas em determinada faixa etária. Idem